Medo e vitória: um ano após tragédia, Friburguense renasce da lama

Faz um ano que Lucas Santos Siqueira acordou assustado com o temporal que atingiu Nova Friburgo durante a madrugada daquele 12 de janeiro de 2011. Por mais que pesasse no ar a impressão de que algo além do aceitável havia ocorrido, ele não podia imaginar que a cidade estava destruída. Não podia imaginar que sua namorada havia sido arrastada pela correnteza - sobrevivido em um último esforço. Não podia imaginar que sua sogra, com apenas 37 anos, estava morta. Lucas é volante titular do Friburguense. Ele ajudou a colocar a equipe serrana novamente na elite carioca. E, passado um ano, lida com o pânico natural por nova tragédia.
Bidu, titular do Friburguense, sempre preocupado com as águas que invadem seu bairro de infância, palco de mortes em janeiro de 2011 (Foto: George Magaraia / Globoesporte.com)

A semelhança é inevitável. A diferença está em um detalhe aqui, um acaso ali, um lance de sorte ou um lamento de azar acolá. De resto, as histórias da dupla de volantes do Friburguense são quase cópia uma da outra. O drama as deixou parecidas – entre si e entre aquelas vividas por todos os habitantes de uma cidade que caminha devagar para voltar a ter pedras sobre pedras. O porém é que Bidu e Lucas são protagonistas de um símbolo de renascimento. No pior ano da história de Nova Friburgo, o clube da cidade venceu. Tirou esperança do meio da lama. Voltou para a Primeira Divisão. Vai disputar o Campeonato Carioca. E acredita que poderá ir mais longe, munido das cicatrizes daquele 12 de janeiro de 2011.
Para onde olha, Bidu encontra tristeza

(Foto: George Magaraia / Globoesporte.com)
Bidu, 31 anos, primeiro volante, marcador, sujeito que carrega no DNA a responsabilidade do desarme, foi desarmado quando deu de cara com uma Nova Friburgo arrasada. A primeira coisa que ele pensou, um ano atrás, foi retornar ao bairro onde crescera - e de onde, por sorte, saíra menos de um ano antes. Sua mulher e seu casal de filhos estavam em segurança, em uma área mais alta da cidade. Restava saber o que ocorrera com as demais pessoas próximas a ele. A resposta seria um golpe que ele jamais esqueceria.
A primeira missão de Bidu foi saber como estava seu sogro. Ele precisava acalmar sua esposa, desesperada por notícias do pai dela. O jogador levou quatro horas e meia para percorrer um trajeto que costuma fazer em 20 minutos. No meio do caminho, a cada metro percorrido de carro ou a pé, encontrou o caos. Corpos espalhados. Casas destruídas. Ruas devastadas. Naquele momento, ele soube que havia perdido parte das pessoas com quem conviveu por três décadas no bairro de Conselheiro Paulino.
O sogro de Bidu estava bem. Os parentes diretos do volante também haviam sobrevivido. A partir desta certeza, o jogador levou mais quatro horas para retornar até onde estava sua esposa e tranquilizá-la. Não havia comunicação na cidade. O jeito foi percorrer o caminho de volta, falar rapidamente com ela e retornar mais uma vez a Conselheiro Paulino. Ele precisava doar suas forças ao bairro.
- Vi pessoas cavando com as mãos. Ajudei como podia. Quando percebia que havia um corpo, ficava mais longe. Não podia ver aquilo. Vai ficar marcado para sempre – disse o jogador.
Os corpos espalhados pelo bairro eram de pessoas conhecidas dele. Por um simples motivo: ele conhece todos que moram lá. Na terça-feira, o jogador percorreu as ruas de Nova Friburgo com a reportagem do GLOBOESPORTE.COM. Foi comentando o que via, descrevendo o caos.
- Aqui acharam um carro com quatro caveiras dentro.
- Aquela barreira matou vários amigos meus.
- Aqui morreu muita gente.
- Aquele morro ali está condenado. Meus tios moram ali. Quando começa a chover, sai todo mundo.
Autor: ,postado em 12/01/2012
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