Scheidt marca adeus para 2016, 20 anos após primeira medalha olímpica

Ao ser perguntado se planeja criar um projeto social para a vela, o bicampeão olímpico Robert Scheidt arranca risadas de um velho amigo ao redor ao responder que tem sim: "Depois que eu me aposentar". Aos 41 anos, a hipótese de largar a vela soa como piada para quem o conhece. Em 2016, o ouro em Atlanta, seu primeiro pódio, vai completar 20 anos. Duas décadas atrás muitos de seus adversários eram crianças que, no máximo, deviam brincar de barquinho de papel.
Dono de cinco medalhas olímpicas, Scheidt já venceu tudo o que podia. Mas sabe que o tempo é invencível. Quando a classe Star deixou de ser olímpica, ele desfez a dupla com Bruno Prada após a prata em Pequim e o bronze em Londres para voltar à Laser. E de cara levou seu 14º mundial, mesmo em um barco que depende só de suas forças. Com o improvável retorno da Star aos Jogos, ele decreta: o Rio será a sua última Olimpíada.

Após o quarto lugar no Aquece Rio, primeiro evento-teste para os Jogos do Rio, Scheidt falou sobre a expectativa para a despedida olímpica. Modesto, disse que ainda precisa se classificar. Avaliou a movimentação das equipes estrangeiras - "já mapearam toda a Baía de Guanabara" -, analisou as dificuldades que a vela encontra para se popularizar e criticou as constantes mudanças de classes olímpicas.
Em 2016 sua primeira medalha olímpica vai fazer 20 anos. Você vislumbra algo para depois das Olimpíadas? Vela oceânica, ou de repente esticar até 2020 se a Star voltar?
Mesmo com a sua experiência disputar os Jogos no Rio vai ter um friozinho na barriga a mais?
- Vai ter. Vai existir uma torcida muito grande. Uma tensão muito grande para os atletas brasileiros. A gente tem que tirar isso do lado positivo, não como pressão e cobrança. Não acho que pelo fato de ser no Brasil haverá muita vantagem para a gente porque os estrangeiros já conhecem a raia. Eles têm uma grande tecnologia, já mapearam toda a Baía de Guanabara com GPS, sabem como já funciona o vento, têm meteorologistas rodando com dois computadores todas as manhãs fazendo a previsão do tempo. Então, vai ser mais na energia que a gente vai ter de estar competindo no nosso país.

Você já disse que nunca precisou de meteorologia para ganhar medalha.
A meteorologia serve para te dar uma tendência sobre o que vai acontecer no dia. Mas não é uma coisa que você tenha que levar a ferro e fogo. Por exemplo, hoje (no último dia do Aquece Rio) a meteorologia falou que o vento ia para a esquerda. E o que aconteceu? O vento foi para esquerda, mas depois ele voltou para a direita e depois foi para a esquerda de novo. Então você perde a hora dessa volta para a direita e fica só focado no que o meteorologista falou. Você faz um voo cego. E não é assim. A vela é um jogo de momento. Então, o vento foi um pouquinho para lá, mas não quer dizer que ele volte 10 graus daqui a cinco minutos e vá de novo. Você tem que estar olhando para fora e tomando decisões rápidas.
A vela é um esporte de difícil compreensão para público geral. Nos Jogos de Londres colocaram um telão na praia e um sistema de som com uma pessoa explicando para o público o que acontecia. Como fazer para tornar a vela mais próxima?
- É isso que eles estão tentando com a criação da medal race, uma regata próxima da terra. A ideia é fazer nas Olimpíadas uma arquibancada próxima à praia do Flamengo para o público assistir a essas regatas, que são curtas. Não é tão simples uma pessoa que nunca viu uma regata entender o que está acontecendo. Tem que haver uma educação do público para entender como é uma largada e quais são as regras básicas.
Ouro Atlanta 1996 (Laser)
Ouro Atenas 2004 (Laser)
Prata Sydney 2000 (Laser
Prata Pequim 2008 (Star)
Bronze Londres 2012 (Star)
O modelo da medal race está dando certo?
- Acho que está. As Olimpíadas de Londres e de Pequim foram um sucesso. Mas para o velejador a medal race não é boa porque são muitos pontos em jogo em uma regata muito curta. Então, a ênfase é muito na largada e na primeira montagem de boia. Depois fica difícil recuperar. Mas para o espectador é uma regata dinâmica, onde muita coisa pode acontecer. Os pontos contam em dobro e não pode descartar a regata.
Falta uma cara na vela, como a natação tem o Michael Phelps e o atletismo, o Usain Bolt?
- Uma das coisas mais importantes é promover mais as personalidades do esporte. O Torben Grael, o Ben Ainslie, que ganhou quatro medalhas de ouro, o Iain Percy, entre outros.
Você...
Temos atletas extremamente vitoriosos. É importante a vela promover mais essas personalidades ao invés de ficar mudando as classes de barco em cada ciclo olímpico. As classes têm que permanecer durante vários ciclos olímpicos, no mínimo três ou quatro, para se afirmarem. E até para países com menos recursos acompanharem e investirem naquilo. Imagina você investir numa classe olímpica e no outro ciclo ela já não é mais olímpica. Tudo o que você investiu é jogado fora.

Você faria uma crítica à Federação Internacional de Vela?
Acho que essa nova gestão vai mudar muita coisa. Estão querendo criar um circuito nos moldes da ATP (Associação dos Tenistas Profissionais) com regatas bem dinâmicas, só com os 20 primeiros do ranking mundial, com grandes patrocinadores e regatas ao vivo na internet. Mas tem o conselho da Isaf com pessoas conservadoras que querem manter a vela como ela sempre foi. Elas têm medo de fazer grandes mudanças. Mas acho que o momento é agora.
Autor: ,postado em 11/08/2014
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