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"É campeão!" Grito dos torcedores do Bahia em 1989 foi o da Bahia inteira



Dia 20 de fevereiro de 1989. O torcedor Tricolor, em êxtase, comemorava o bicampeonato brasileiro, a segunda estrela na camisa do clube, conquistada um dia antes, em Porto Alegre, no empate por 0 a 0 com o Internacional. E o jornalista Paulo Leandro publicava, na Tribuna da Bahia, a reportagem que você vai ler (ou reler) agora.

A Barra foi o ponto de concentração dos torcedores até as primeiras horas do dia de hoje.

A certeza de que o Bahia seria campeão fez com que a multidão de torcedores começassem a colorir a cidade de azul, vermelho e branco, bem antes do apito final do árbitro Dulcídio Wanderley Boschilla. Já aos 30 minutos do segundo tempo e aos gritos de “é campeão”, os primeiros tricolores começaram a se preparar para a grande festa que tomou conta de Salvador até altas horas da madrugada.

Quando Dulcídio encerrou o jogo, então, foi a loucura total. No principal ponto de encontro da galera, no Farol da Barra, teve de tudo, desde o topless descontraído da torcedora feliz até a liberação infinita do imaginário de outro torcedor, que arrancou um aparelho de uma sorveteria, muito parecido com uma taça de campeão, e saiu desfilando no ombro de companheiros exaltados.

A reunião popular encheu de criatividade a praça, que como já disse o poeta, “é do povo”. E ontem, foi do povão tricolor que entoou cantos baseados em letras conhecidas, ligeiramente aperfeiçoadas para a festa, como “Ele é Bobô, é tricolor”, baseada na música “Elejibô” e “Tá com medo Taffarel”, em lugar de “Tabaréu”, curtindo com o fracasso do goleiro do Internacional.

- Eu to sonhando, eu to sonhando, ou o Bahia é campeão mesmo? – perguntava, com sinceridade, um torcedor.

As dezenas de bandeiras tricolores balançando ao vento, e as batucadas, entretanto, não tiveram uma companhia fundamental para uma conquista à baiana: faltou o trio elétrico, a todo momento exigido pela galera. A raiva do bairrismo dos comentaristas da Rede Globo, ficou nítida na repetição insistente do refrão: “um, dois, três, quatro, cinco, mil, eu quero que a Globo vá pra...”

Um justo desabafo para quem teve de ouvir comentários tendenciosos de Raul Plassman e Galvão Bueno durante os jogos semifinais e finais. Para uma torcida acostumada às conquistas estaduais, mas que não chegava ao título nacional há 30 anos, a comemoração foi merecida. E como se já pedisse outros títulos, como a conquista da Taça Libertadors e do Mundial, os torcedores gritavam a plenos pulmões: “mais um, mais um título de glória...”

Nadinho, torcedor silencioso

O goleiro campeão de 1959, Nadinho, hoje o cidadão Leonardo Cardoso, advogado trabalhista, não saiu de seu estilo caladão em nenhum momento dos 90 minutos da partida decisiva entre internacional e Bahia. Ao final do jogo, um sorriso escancarado simbolizou a conquista, comemorada com um forte braço no filho caçula Leo.

- Meu jeito é esse desde quando era goleiro. Nunca fui de falar muito. Prefiro torcer calado – disse Nadinho, rodeado por parentes e amigos na ampla casa onde mora, na travessa Xangô, em  Itapuã.

Desde cedo a casa de Nadinho se encheu par o que seria a grande festa do campeão do Brasil. Regado a uísque, uma bem “sarada” batida de cambuí e dezenas de cervejas, o encontro tricolor até demoveu alguns rubro-negros ranhetas, que insistam em “azarar”o fabuloso esquadrão de aço.

- Não vai ganhar de jeito nenhum –diagnosticou um dos presentes, o amigo de Nadinho, Ari, que desistiu de torcer pelo Internacional, logo no primeiro minuto ao sentir a premonição de que a tarde seria mesmo tricolorida.

Nem a imagem ruim do televisor, provocada por um defeito na antena, diminuiu o ímpeto da torcida organizada de Nadinho, ainda um ídolo tricolor passados 30 anos da conquista da primeira Taça Brasil. Todos fizeram uma corrente positiva, aumentando a energia do time baiano a 3.090 quilômetros de distancia, em pleno Estádio Beira-Rio, em Porto Alegre.

- Sou Vitória, mas o Bahia tá tão bem, que não tem nada a ver deixar de dar uma força ao nosso representante – resumiu, com elevado estado de espírito o filho caçula de Nadinho, Leo, sempre abraçado à namorada.

Enquanto Nadinho curtiu em família o segundo título nacional pelo Bahia, outro ídolo de 1959, o ponta-direita Marito preferiu se esconder em um sítio em Lauro de Freitas. Longe da imprensa, Marito trancou-se num quarto e viu o jogo como gosta: sozinho, controlando o nervosismo com muita fé na conquista do título.

Biriba, festa de um novo título

O pescador Armindo Avelino Santana, o Biriba, do time campeão de 1959, se defendeu com a única arma de que dispunha contra o nervosismo que sempre o ataca nos jogos do Bahia: a cerveja gelada. Biriba começou a entornar vários copos de cerveja logo depois do almoço e só parou depois de ver seu Bahia campeão do Brasil, com direito a volta olímpica no Yvos Bar, onde assistiu ao jogo, vizinho a sua casa, perto do final de linha de Itapuã, até a lagoa do Abaeté, carregando uma grande folha de palmeira. Biriba estava emocionadíssimo com o título de campeão nacional do Bahia.

- Campeão, não. Bi, bi, bi, bi de Biriba – repetiu o ponta-esquerda de 1959, muito doido de goró.

Rodeado de amigos, Biriba até que teve condições de ver o primeiro tempo do jogo com a reserva de sobriedade que restou. No intervalo, entretanto, já não entendia direito o que se passava, com tantos gritos de “dá-lhe Bahia” e “é tricolor” no seu ouvido. Sem se ligar nas jogadas, Biriba reagiu com puro instinto às imagens da televisão.  Quando aparecia o centroavante Nilson, Biriba dava banana: “aqui pra você”.  No close dos jogadores do Bahia, o ex-ponta tentava articular um sinal de positivo, mas nem sempre conseguia o objetivo, entortando a mão sem nada comunicar.

Biriba até lembrou a sua ausência da Seleção Brasileira que conquistou o bicampeonato mundial no Chile em 1962, treinada pelo experiente Aimoré Moreira, e fez uma comparação com o momento atual, exigindo a presença de pelo menos três jogadores campeões do Brasil na seleção nacional que disputará a Copa América e as eliminatórias da Copa do Mundo de 1990, na Itália.

A partir dos 30 minutos do segundo tempo, sóbrios e bêbados presentes no Yvos Bar foram se aproximando da pequena televisão colocada estrategicamente no fundo do estabelecimento. Dulcídio Wanderley  Boschilla encerrou o jogo e Biriba foi à glória, carregado e venerado pelos torcedores. Ali estava um dos primeiros campeões do Brasil, nos braços do povo, com uma só ideia na cabeça.

Autor: ,postado em 19/02/2014


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